domingo, 26 de janeiro de 2014

oito anos e meio e uma biografia

O que você faria em 3096 dias?



Eu ainda estudava, mais precisamente troquei de escola, passei no vestibular, dancei, me mudei de cidade, vivi um sonho, voltei para a realidade, praticamente terminei minha faculdade e vivi, tudo isso em um espaço de tempo de oito anos e meio. Por isso não foi surpresa um livro com a lombada branca e que começava com um número alto ter me chamado a atenção em um sebo de Vitória. O resgatei dentre tantos outros que dividiam-se em um espaço espremido, muitos dos quais acredito que nem tenham ganhado o meu olhar, mas esse me fisgou; como amor a primeira vista (e aqui meu namorado vai me desculpar).
Por isso fiquei tão intrigada quando li "3096 dias Natascha Kampusch", e logo uma notícia vista anos atrás de uma menina loira sequestrada me veio a mente. Não lembrava ao certo o enredo, mas sabia de detalhes por alto, ainda assim me interessei e achei que talvez os dezesseis reais desembolsados pela publicação valessem a pena. Hoje não me arrependo de nenhum centavo gasto nele.
Na quarta série Natascha convenceu sua mãe a deixá-la ir sozinha para a escola. Bastava atravessar seu condomínio e andar um pequeno trecho que ela conhecia perfeitamente para chegar ao destino, ela conseguia fazer aquilo. Naquela manhã discutiu com a mãe e ainda chorosa saiu para sua primeira caminhada rumo a sala de aula. Nunca chegou. Aos dez anos foi sequestrada e por 3096 dias viveu em um pequeno cativeiro sem contato com praticamente ninguém exceto Wolfgang Prikopil. Ao longo dos dias e anos foi mal alimentada e sofreu um abuso psicológico, sexual e moral, além dos diversos outros existentes.
O pequeno espaço continha seis metros quadrados e servia de abrigo para a jovem que ali viveu o fim da infância e sua adolescência. Foi privada de comida, água e luz, além de ter sofrido abusos e surras constantes por sua "desobediência". A biografia é impactante e narra com riqueza de detalhes a tortura e solidão que durou o cativeiro. A respeito do que a imprensa cobriu, com a fuga da menina o sequestrador cometeu suicídio, mas o final é a parte mais normal de um livro que surge com o inesperado a cada página, e aflige o leitor que sabe se tratar de um caso real.
Eu gosto de livros em geral e biografias tendem a ser interessantes, por isso não sou parâmetro em algumas situações, porém essa obra é tão fora do comum que minha mãe (e até minha tia) leram em uma velocidade impressionante. Mamãe então acho que nunca havia devorado um livro como fez com esse: levou apenas um final de semana - apesar de não ter me superado, pois li em um dia. São 223 páginas que parecem três. A história se desenrola, não há um dia como o outro, nem uma maneira de não se prender ou sentir ligada a narrativa. Ela é angustiante e brilhante ao mesmo tempo. Foi como ler o relato de Anne Frank e da guerra, mas tendo nesse caso um final mais próximo ao feliz.
Um documentário também foi produzido retratando o caso, contudo ainda prefiro a biografia - como sempre - pela riqueza de detalhes que podem passar imperceptível aos olhos do telespectador. Para quem já leu vale assistir.
O caso expôs a polícia austriaca e revelou diversos erros, como a falta de suporte no depoimento de uma menina que presenciou o sequestro e que nunca foi solicitada para descrever o bandido para um esboço de retrato falado, ou a visita da polícia o 43º dia do rapto, quando haviam divulgado a pista da van branca que levara a menina. Prikopil colocou diversos entulhos para simular uma reforma da casa no carro que não recebeu a devida vistoria dos policiais. Além disso devido ao seu espírito cooperativo, cães farejadores nunca foram levados a sua casa - e por conseguinte não descobriram antes da fuga da menina o cativeiro. Falhas essas que poderiam ter evitado anos de abuso infantil.
Dizer que o livro é fantástico se torna, portanto, uma redundância que fiz questão de colocar aqui. Vale a pena a leitura. Segue abaixo um trailer do documentário "3096 days".


sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Sutilidade presente nas estrelas



Já estava escrito na Bíblia que "o filho pródigo a casa torna", pois estou de volta. Ainda mais sem tempo que antes, porém aos poucos isso acaba, já que estou ao final do meu Trabalho de Conclusão de Curso, que como amante da dança e dos livros se tornará um livro-reportagem - em breve maiores detalhes, por enquanto puro segredo!

O livro escolhido de hoje não é um clássico (ainda), tampouco tem anos de tradição ou uma história de intrigas e desafios. Ele é simples, mas cativante; emocionante, mas verdadeiro; ficção, mas tão real que tudo parece fazer parte de um enredo profundamente vivido por alguém nas condições descritas. Esther Earl modificou a maneira do autor de encarar a realidade. Como algum leitor (se é que isso ainda tem pessoas que leem e não uma vaga - e quase ex - estudante de jornalismo a divagar suas vagas filosofias) mais atento deve ter percebido, o livro em questão chama-se "A culpa é das estrelas" (2012), de John Green.
A publicação trata sobre a vida, o cotidiano, os sonhos, desafios e as perdas que uma menina de 16 para 17 anos enfrenta com um câncer estágio IV originado na Tireoide, mas com metástase nos pulmões. A sobrevivência de Hazel não é fácil. A incerteza de uma morte certa em alguns anos a mais - prolongados com o auxílio de uma medicação ainda em teste - era um incentivo para ela evitar sua adolescência e o turbilhão de sentimentos que nela existem. Nada parecia realmente ter um significado em seus dias, até o momento em que conhece Augustus em uma reunião para sobreviventes do câncer. O enredo é todo construído na simplicidade e no singelo descobrimento do amor adolescente em uma forma mais pura, com os olhos inexperientes e ao mesmo tempo maduros de Hazel, que mesmo ainda pequena já havia enfrentado mais dificuldades que muitos adultos.
A simplicidade da escrita que preenche lacunas, torna a leitura uma descoberta a cada linha. O leitor não consegue parar e simplesmente devora o livro; sem exageros. Palavra por palavra Hazel ganha vida nas 283 páginas que compõem a obra em sua tradução para o português. Em um romance totalmente dramático aconselho aos emotivos que preparem os lenços, as lágrimas aparecem involuntariamente tal a beleza e identificação com os personagens.
Se a capa me despertou uma curiosidade há tempos, optei por esperar algum tempo antes de cogitar adquirir o livro por temer que pudesse ser apenas mais algum sucesso adolescente febril. Não é. Ganhei de presente e recomendo para um, uma pitada de tudo aquilo que há algum tempo não encontrava em um livro jovem com essas características. Se precisasse escolher um título para comparação não ousaria e colocaria o infanto-juvenil Pollyanna (1913) e seu jogo do contente no páreo. Quem nunca leu, leia, os dois de uma só vez.
"A culpa é das estrelas" foi inspirado em uma jovem em semelhança com Hazel, seu nome verdadeiro era Esther Earl. Em uma postagem da editora Intrínseca, responsável pela publicação no Brasil, o autor fala:

"Eu gostaria que ela tivesse lido A culpa é das estrelas. Imagino que teria achado um livro um pouco improvável, mas espero que ainda assim teria gostado dele. Só que nunca saberei. Estou impressionado com o fato de o livro ter alcançado um público tão amplo, mas a pessoa que eu mais quero que o leia nunca o lerá".

Chorei novamente!

ps.: O livro está previsto para sair em filme ainda esse ano.


John Green, nascido em agosto de 1977 em Indianápolis, nos Estados Unidos, formou-se no ano de 2000 em Inglês e Estudos Religiosos. Teve como primeiro livro "Quem é você, Alasca?" (2005), que ganhou o prêmio Michael L. Printz (da American Library Association) por "excelência em literatura para jovens adultos". Escreve histórias simples, leves e que nos fazem sentir. Ainda não o conheço tão bem, mas certamente lerei mais.